A APREGOADA “VALORIZAÇÃO” DOS TRABALHADORES

Muitas são as anomalias e perversões salariais constantes de uma TRU cada vez mais injusta e degradada a todos os títulos, que impõe a remuneração mínima aos 5 primeiros níveis. É um notável malabarismo do governo PS, qual inventor de uma nova “tabuada”, cujos resultados têm consequências devastadoras para muitos milhares de trabalhadores.

Com a publicação do Decreto Lei (DL) 84-F/2022, de 16 de Dezembro, o governo PS aprovou um conjunto de medidas que designou como “valorização dos trabalhadores”, mas que não passaram, uma vez mais, de autênticos remendos, que não podem esconder uma realidade bem diferente da que supostamente se pretende exibir.

Valorização seria corresponder minimamente às reivindicações da Frente Comum, em que o STAL se integra e desempenha um papel determinante, em prol da defesa dos direitos e legítimas expectativas dos trabalhadores.

Mas não foi esse o caminho imposto pelo governo, que se limitou, em matéria salarial, a prever, para 2023, o que designa como valorização salarial global de 5,1% e um aumento salarial médio de 3,6%, como proclama no preâmbulo daquele diploma, fixando assim a remuneração mínima da Administração Pública em 761,58€, superior, pasme-se, em 1,58€ ao Salário Mínimo Nacional (SMN) e, em regra, acresceu os restantes salários num mínimo de cerca de 52€ ou 2%, além de, nalguns casos, atribuir um índice superior ao correspondente à respetiva posição remuneratória.

Abissal é, porém, a diferença do que o governo PS impôs e o que justamente se reclamou, se pensarmos, especialmente, na enorme perda do poder de compra dos trabalhadores em 2022, e previsível para 2023, que, aliás, já ultrapassa os 20% desde 2009, como temos denunciado.

AUTÊNTICO ROUBO DOS PONTOS EM 2019

Muitas são as anomalias e perversões salariais constantes de uma Tabela Remuneratória Única (TRU) cada vez mais injusta e degradada a todos os títulos, impondo a referida remuneração mínima aos 5 primeiros níveis, notável malabarismo do governo, inventor de uma nova tabuada em que 5 é igual a 1, e que o governo continua a impor, com consequências devastadoras para muitos trabalhadores, por exemplo, operários altamente especializados com mais de 20 anos de antiguidade que apenas auferem o salário mínimo!

Esta é uma situação gerada pelas regras impeditivas da progressão e degradação da TRU, mas também pelo autêntico roubo dos pontos de que foram vítimas os trabalhadores em 2019, roubo “legitimado” pelo DL 29/2019; situação que deveria ter sido, pelo menos, amenizada no corrente ano se o governo tivesse permitido a progressão dos assistentes operacionais com, pelo menos, 15 anos de antiguidade e não 30, como veio a exigir no DL 84-F/2022!

A compressão salarial, patente nos referidos 5 primeiros níveis, reflete-se também nos restantes, destruindo o princípio da proporcionalidade que o artigo 147.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP) tem imposto, mas agora sob o advérbio “tendencialmente” (!), querendo assim o governo legitimar o que, manifestamente, tem desrespeitado ao longo de muitos anos.

INJUSTIÇA INADMISSÍVEL E ABSURDA

Muitas outras são as injustiças objetivamente impostas pelo citado DL, referindo, por exemplo, que muitos trabalhadores, da mesma carreira, têm um aumento inferior ao dos seus colegas, cerca de 52€, em vez de 104€, simplesmente pelo facto de ainda permanecerem em posições intermédias, isto nos casos em que as posições reais foram valorizadas em cerca de 104€!

É inadmissível e absurdo que continuem a existir situações desta natureza! Tal como é o que se passa com as chamadas carreiras “não revistas” e/ou “subsistentes”, cujos salários dependem dos índices detidos, sendo os respetivos valores calculados com base no chamado “índice 100”, imutável desde 2009! Para todos estes, o governo PS impôs a regra geral de aumento de cerca de 52€ e nada mais, pesem embora vagas promessas de futura “negociação”.
Aliás, nalgumas dessas carreiras, os trabalhadores estão praticamente no fim dos escalões indiciários, atribuídos desde há longos anos, mas, pela degradação operada, auferem apenas a referida remuneração mínima ou uma importância muito aproximada.

Às injustiças salariais que referimos, a título de exemplo, juntam-se muitas outras, nomeadamente as ligadas à estrutura das atuais “carreiras”, quer do regime geral, quer do regime especial.

Como sabemos, as carreiras gerais foram arrasadas pela Lei 12-A/2008 e diplomas complementares, transformando-se em meras categorias, porquanto, na prática, não existe qualquer possibilidade de acesso a uma categoria superior dentro de cada uma delas.

E, subsistindo a possibilidade de alteração de posicionamento remuneratório, bem conhecemos os obstáculos impeditivos dessa progressão, impostos pelo SIADAP e pelas regras gerais que só após a obtenção de 10 pontos impõem obrigatoriamente essa evolução.

Regras de progressão que igualmente vigoram para as restantes carreiras, mesmo qualificadas como especiais, sendo que estas, quando revistas, acabam por ser igualmente descaracterizadas como carreiras.

VIOLAÇÃO DOS CONTEÚDOS FUNCIONAIS

À referida destruição das carreiras junta-se a desqualificação dos respectivos titulares, cuja profissões são frequentemente postergadas, impondo as entidades empregadoras conceitos genéricos de conteúdos funcionais, por exemplo à imagem e semelhança do que consta no Anexo à citada LTFP, procedimento intolerável, violador do conteúdo funcional específico de cada profissão, à luz da Classificação Portuguesa das Profissões e de diversos diplomas legais que definem as competências de um vasto conjunto de profissões.

A violação dos conteúdos funcionais, generalizando tarefas, tem dado azo aos maiores abusos, fazendo dos trabalhadores “pau para toda a obra”, sem qualquer respeito pela profissão que, aliás, esteve formalmente na génese da respectiva admissão ao serviço.

Abusos que, sendo transversais à generalidade das carreiras, são mais patentes na chamada “carreira” de assistente operacional, cujos trabalhadores não têm essa profissão, mas sim, por exemplo, a de operários de diversas especialidades, ou de outras diferentes actividades.

Daí que, consequentemente, prolifere a polivalência funcional, ainda que, nalguns casos, se possa compreender, nos limites da razoabilidade que a lei permite, desde que não haja desvalorização do estatuto profissional dos trabalhadores, tendo também em conta as enormes carências de recursos humanos nalgumas autarquias, como sucede frequentemente nas freguesias. No entanto, o recurso a essa figura deveria depender sempre da atribuição de um justo incentivo, especialmente de natureza remuneratória, o que não sucede!

RECUPERAÇÃO DAS CARREIRAS E DAS PROFISSÕES

Impõe-se a cada vez mais urgente recuperação da estrutura das carreiras e das respetivas profissões, existente antes da sua destruição, pela Lei 12-A/2008, recuperação que, naturalmente, tem de ser objeto das adaptações e valorizações justificáveis pelo decurso de tantos anos, durante os quais os problemas se agravaram substancialmente.

E dentro desse agravamento das condições de trabalho não podemos deixar de referir o recurso às mais diversas formas de trabalho precário, de que são exemplo não só os contratos a termo, mas também os comummente designados “a recibo verde”, os contratados a empresas de trabalho temporário e o recurso a desempregados, neste caso designados por contratos de emprego de inserção.

Todos esses contratos têm uma característica comum, representando mão de obra barata e apetecível, sem compromissos de efetividade, à revelia dos princípios constitucionais consagrados, especialmente, nos artigos 53.º, 58.º e 59.º, da Lei Fundamental, e dos preceitos legais que regulam esta matéria.

Sendo irregulares é lamentável que persistam situações que deveriam ter sido regularizadas oportunamente, por exemplo através do chamado PREVPAP, instituído pela Lei 112/2017, apesar de esta lei não ter correspondido à plenitude das situações em apreço, ficando, mesmo assim, muito longe de ser respeitada.

Neste contexto, impõem-se novas medidas, que combatam eficazmente estes desmandos, em ordem a que os referidos preceitos constitucionais não sejam, na prática, palavras vãs, passados que estão quase 50 anos após a Revolução de Abril!

     
  TRIBUNAIS - ACÓRDÃO HISTÓRICO
É de saudar um recente Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, prolatado em 8 de Setembro de 2022, que, a propósito de um contrato a termo, julgado irregular, doutamente impôs a sua imediata conversão em contrato por tempo indeterminado. Trata-se, de facto, de um Acórdão histórico, assumindo a jurisprudência administrativa, pela primeira vez, o entendimento que tem sido profusamente acolhido pelos Tribunais do Trabalho. O nosso lema é, portanto, utilizar este mecanismo e todas as restantes medidas que se adequarem à erradicação das situações de precariedade, abusiva e profusamente utilizadas pelas entidades empregadoras. Lema que, naturalmente, continuaremos a perfilhar na luta pela justa valorização dos trabalhadores, pela recuperação das carreiras e profissões e pelos demais direitos que aos trabalhadores são devidos, inspirando-nos e exigindo a dignificação das condições de trabalho, consagradas na Constituição da República.