CONCESSÕES PREJUDICAM INTERESSE PÚBLICO
A Auditoria do Tribunal Contas às PPP no sector das águas confirma a verdadeira natureza destes negócios: os privados embolsam chorudos lucros, as populações e os municípios pagam a factura.
A auditoria do Tribunal de Contas (Tdc) às PPP’s no sector das águas (sistemas em baixa), divulgada dia 27, vem confirmar e dar razão ao combate e às sucessivas denúncias do STAL contra a privatização dos serviços públicos de águas e saneamento, comprovando que este é um negócio altamente lesivo para os municípios e as populações que são obrigados pagar todos os custos, enquanto os privados embolsam chorudos lucros.
Todas as 19 concessões municipais analisadas pelo TdC: Alcanena, Barcelos, Batalha, Campo Maior, Carrazeda de Ansiães, Figueira da Foz, Fundão, Ourém, Trancoso, Gondomar, Setúbal, Paredes, Valongo, Fafe, Santa Maria da Feira, Matosinhos, Santo Tirso/Trofa, Paços de Ferreira e Marco de Canaveses, apresentam uma desigual partilha de riscos beneficiando claramente os operadores privados em detrimento dos municípios.
Na generalidade dos contratos, as “projeções de crescimento populacional e estimativas de consumo que serviram de base aos contratos de concessões são pouco rigorosas e estão desfasadas da realidade”. A falta de rigor é tal que “tais estimativas foram fornecidas e aprovadas pelas entidades concedentes (os municipios), sem que as mesmas fossem previamente auditadas ou postas em causa pelos próprios municípios”. Para agravar ainda mais a situação, verifica-se que três em cada quatro contratos de concessões das águas garantem compensações aos concessionários caso haja uma redução no volume de água faturada ou na evolução do número de consumidores.
Como aponta o relatório, duas destas concessões já foram alvo de decisões do Tribunal Arbitral que determinaram o pagamento de pesadas indemnizações aos operadores privados. São os casos conhecidos de Marco de Canaveses, em que o município foi condenado a pagar à entidade gestora, Águas do Marco, a quantia de 16 milhões de euros. E de Barcelos, condenado a pagar à Águas de Barcelos, de forma faseada até ao termo do contrato, cerca de 172 milhões de euros, valor que é 3 vezes o orçamento municipal.
As taxas de rentabilidade (TIR) existentes são verdadeiramente obscenas, variando entre 9,5% até aos 15,50%. É o próprio TdC que afirma que “Este nível de expectativa de remuneração acionista em caso base afigura-se inaceitável à luz do atual quadro orçamental e económico”, recomendando a revisão em baixa das TIR superiores a 10% “em face das alterações de circunstâncias e por razões fundamentadas de interesse público.”
Elucidativas são também as conclusões do Tribunal que revelam que “os concedentes públicos apresentaram sérias limitações no que respeita à capacidade de monitorização financeira e análise de risco destes contratos, resultando assim, numa menor capacidade técnica e negocial para defender os interesses financeiros dos municípios, incluindo, os dos próprios utilizadores”, confirmando também aqui a posição do STAL de que os municípios seriam presa fácil dos poderosos grupos económicos.
Tal como são claras as considerações levantadas no relatório sobre a legislação dos serviços de água que no entender do Tribunal penaliza os municípios e consumidores e beneficia as concessionárias confirmando assim a lógica seguida por sucessivos governos de consagrar e proteger legalmente os lucros privados.
Igualmente esclarecedora é a verificação efectuada pelos auditores de “que a ERSAR realizou apenas oito auditorias, o que corresponde a cerca de 30% do universo das concessões, ficando aquém do desejável em face da necessidade de controlo das obrigações contratuais dos respetivos concedentes e concessionárias.”
Face a tudo isto, e a muito mais que este relevante e importante relatório aponta, o STAL não pode deixar de concluir que a existência de tais contratos demonstra bem como a privatização abre portas a toda a espécie de práticas corruptas altamente lesivas do interesse público e de como são ilusórias as teses que afirmam que o controlo por parte das entidades fiscalizadoras e reguladoras são suficientes para impedir os desmandos e abusos dos grupos privados na procura incessante do máximo lucro.
Aliás, é significativo que esta auditoria só agora tenha sido feita, 20 anos depois da primeira privatização dos serviços de águas, que teve lugar em Mafra.
O STAL considera que é, pois, inevitável e imprescindível, por fim às privatizações/concessões, criar as condições para a remunicipalização dos serviços de água e saneamento privatizados terminando com estes contratos abusivos e ilegais, e responsabilizar quem tiver de ser responsabilizado.