UM DIREITO NÃO PODE SER UM NEGÓCIO!
A privatização nunca será solução. É preciso uma gestão pública robusta e competente, agir na preservação e protecção de todos os valores da água, assegurar o direito à água e saneamento para todos, valorizar o serviço público, os trabalhadores do sector e reforçar o investimento público.
A vitória da direita (PSD/CDS) nas últimas eleições legislativas, tendo em conta o histórico e objectivos, e a pressão do grande capital pelo controlo e posse dos recursos, que se intensificará quanto mais escassa for a água, não auguram nada de bom para a água pública.
Na verdade, o que se pode esperar daqueles que abriram o sector aos privados, com as consequências que se conhecem, que tentaram privatizar a Águas de Portugal, à semelhança do que fizeram com a EGF, e reduziram ao mínimo os serviços de monitorização e gestão da água, se não levar mais longe o caminho da mercantilização e da privatização? Aliás, quer o programa de Governo, quer as Grandes Opções do Plano 2024-2028, sobretudo pelo que não dizem, não deixam dúvidas: o que se desenha é o aprofundamento da ofensiva contra a gestão pública da água.
AGREGAÇÃO DE SERVIÇOS MUNICIPAIS DE ÁGUAS
A pressão para a agregação, utilizando os fundos comunitários como elemento de chantagem, tem-se traduzido, na maioria dos casos, na criação de empresas intermunicipais. Como temos salientado, a colaboração entre os municípios é importante, mas outra coisa é o alijamento da responsabilidade de gestão.
É, por isso, positiva a eliminação, há muito exigida, da medida que vedava o acesso a fundos comunitários por parte de municípios não agregados, incluída pelo anterior governo (PS) no “Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais e Pluviais 2030”, mas é imprescindível reforçar o financiamento das autarquias e o investimento público.
Assumindo graus diversos, as agregações municipais têm significado o aumento de tarifários, degradação de serviços, perda de proximidade e de controlo democrático, desrespeito pelos direitos dos trabalhadores.
No caso da Águas do Pinhal Interior Norte, o Município de Penacova decidiu mesmo abandonar a empresa, que exige ser indemnizada.
Em perspectiva está a agregação da Águas de Coimbra e os municípios de Condeixa-a-Nova, Mealhada e Miranda do Corvo.
Fugindo ao formato empresarial que, sendo importante, não evita alguns dos problemas referidos, foi criada a Águas Públicas em Altitude - Serviços Intermunicipalizados, abrangendo quatro municípios e a AINTAR (uma Associação de Municípios de Fins Específicos), para a gestão do saneamento de águas residuais dos municípios de Carregal do Sal, Santa Comba Dão, Tábua e Tondela.
Já no quadro das “parcerias” entre a Águas de Portugal e os municípios, construídas para contornar a disposição constitucional que estabelece como competência municipal o abastecimento de água e saneamento, mantém-se a ameaça de entrega dos serviços de seis municípios (Amadora, Arruda dos Vinhos, Loures, Odivelas, Sobral de Monte Agraço e Vila Franca de Xira) à EPAL e à Águas do Tejo e Atlântico, pelo que há que continuar vigilantes.
Na Águas do Alto Minho, Valença e Cerveira moveram uma acção junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga para remover a cláusula que os impede de saírem da empresa.
Os privados, como aqui já se escreveu, espreitam a oportunidade, pois a partir do momento em que existe uma maior dimensão, uma maior capacidade técnica e financeira, há todo um desenvolvimento do mercado e das oportunidades que podem ser apropriadas para o sector privado.
A TRANSFORMAÇÃO DA ÁGUA NUM BEM ECONÓMICO DE MERCADO
Coincidência ou não (o Diabo saberá…), dois estudos divulgados recentemente – um da Universidade Católica e outro encomendado pelo lóbi privado do sector (a AEPSA) à FUNDEC – defendem a subida significativa dos preços, determinante no processo de privatização, enquanto o Governo pretende devolver os poderes tarifários vinculativos ao regulador (ERSAR), indispensável para garantir isso mesmo.
Além disso, o primeiro dos referidos estudos defende, ainda, a criação do mercado de água – compra e venda de títulos de utilização/direitos da água que, apesar de legalizado desde 2005 (Lei da Água), não está instituído entre nós – cujas consequências, nos países onde tal existe, estão bem documentadas: separação da água e da terra, para permitir a mercantilização; desregulação do comércio da água entre utilizadores e tipos de uso; apropriação privada da água, excluindo os mais vulneráveis e desprezo por valores não produtivos; o ambiente tende a ser considerado como um actor do mercado, obrigando o Estado a comprar direitos de água para garantir a sustentabilidade dos ecossistemas.
Já o segundo daqueles estudos defende a eliminação de subsídios à exploração, entre serviços e consumos, e mais subsídios ao investimento, leia-se reduzir a água a um bem de mercado, pago pelo consumidor, com um preço fixado de acordo com o modelo de recuperação total dos custos (incluindo a remuneração do capital, ou seja, do lucro), e canalizar dinheiros públicos para os privados, que se “queixam” de receber apenas 1,2% dos subsídios.
A privatização nunca será solução! A água é um direito, não é um negócio, que só vê preços. É preciso uma gestão pública robusta e competente, agir na preservação e protecção de todos os valores da água, assegurar o direito à água e saneamento para todos, valorizar o Serviço Público, os trabalhadores do sector e reforçar o investimento público.
EMPRESAS INTERMUNICIPAIS
Empresa |
N.º Municípios |
Águas do Alto Alentejo |
7 |
Águas do Baixo Mondego e Gândara |
10 |
Águas do Interior Norte |
3 |
Águas do Pinhal Interior Norte |
8 |
Águas do Ribatejo |
11 |
Águas Públicas da Serra da Estrela |
3 |
Tejo Ambiente |
6 |
Vimágua |
2 |